Para o César Machado
Prometo tentar dizer-te que falho
Constantemente,
E que sou imperfeito,
E que as nossas preocupações
Diárias são tão sérias
Quanto marcar férias
E cumprir objetivos.
Foca-te na luz dos mistérios
Mais sérios,
Órficos, que por furtivos aqui não cabem.
Os dias passam
E há mais clientes.
Passam as horas
E mais vaidades eclesiásticas há
A satisfazer. Mais para fazer.
Foca-te na espiral de Tântalo.
Sísifa, a vontade da clientela
Infernal não pode esmorecer.
Foca-te, mas não te fiques
Por aí.
Atira-te aos leões como gatinhos,
Procura nas suas garras os carinhos
Que outros acham na indolência.
Haja paciência.
Prometo pedras
Prometo chagas
Batatas fritas.
Maionese light.
Sombras negras em escala cinza
E algemas de cristal.
Prometo não estragar tudo
Por ser perfeito.
Não me leves muito a peito.
Há ainda muito a tentar.
A tentar-me,
E não sou Cristo.
Sou apenas isto,
Perfeito apenas.
Prometo cenas.
Prometo falhar.
Para a Ana Rute Marcelino
Cheiro de alecrim.
O chão, pela procissão,
Parece um jardim.
Amor é
Não querer saber o que é
Não querer escrever sobre o que é
Pensar pode ser
Mas sem querer
E sem precisar de concluir
O que for
Assim é muito simples isso do amor
A má poesia é dizer lágrimas
Silêncio
Marés
Lua
É dizer corpo e suor.
É discorrer sobre orvalho, geada e flores.
É convocar dores em apóstrofe.
É fazer chorar guitarras
E rimar com cigarras o coachar das rãs.
É dizer noite com palavras diurnas.
É cobrir o sol de gargalhadas soturnas
E abafar a luz com a melancolia do amor.
É usar o ponto de exclamação
E reticências.
É falar do coração!...
De coração. É saltar cacofonias.
É transmutar palavras em excrescências.
Fazer do verbo quistos e tumores.
É dizer o que se quer esconder;
Fingir que as alegrias são dores;
E explicar o que ninguém quer, mesmo, de todo, saber.
Má poesia é toda a poesia.
Nem Homero, nem Virgílio nem Pessoa.
Nem Pessanha, nem Dante nem peçonha.
Só os doidos a escrevem,
Nos espavoridos esgares da ronha,
E a recitam em veludos de hipocondria.
Entretanto, outros passarão por ela
E verão nas formas do seu caos
Sublimes cânticos de profecia.
É assim a pior,
Como será, provavelmente, a menos má,
E mais inútil, da poesia.
Tyler, The Creator, tem uma conversa cheia de contradições com Wolf Haley, um dos seus heterónimos a quem o mesmo atribui a própria autoria deste vídeo. Wolf é caucasiano e é má rês. Mas tem jeito. A fotografia, num preto e branco sublime, joga magistralmente com a instabilidade da focagem, e a sua radical transformação em sombra, como que dobrando a própria instabilidade lírica, confessional e polifónica.
O vídeo foi amplamente considerado um dos melhores do ano de 2011.