Vénus reflectindo sobre o que lê. Escultura em granito, data desconhecida, Paço de Ançariz, Escudeiros, Braga. Foto minha em Creative Commons
Caminhava orgulhoso
Pela quinta, entre as galinhas
Um galo de porte airoso,
Quando ali entre as palhinhas
Sinal de luz percebeu.
“Cocoró, amigas minhas:
Seja o que for, será meu!”
E logo puxou para fora
O fim do desígnio seu.
E descobriu o que outrora
Alguém na eira perdera
E o desilude agora!
Uma pérola colhera
No lixo do logradouro
Que, cioso, removera.
“Decerto serás tesouro”
- Disse o galo, despeitado
“Para quem preza o ouro,
Não p’ra mim, que enganado
Por traiçoeiro luzir
Noutra coisa ia filado!
É natural preferir,
Que, sendo eu bicharada,
Me venha a sorte a servir
De só um grão de cevada
Que de um inteiro colar.”
Tal digo, que não há nada
Que se possa avaliar
Com justeza e afeição,
Se aquele que a encontrar
Não a vir com o coração.
(Versão de Manuel Anastácio)