Domingo, 24 de Março de 2013
Semana Santa

O horror é uma criança sorridente

que em riso perde um dente como quem perdesse um olho.

A tragédia é um velho rabugento

que, à desdita amorosa adolescente, franze o sobrolho.

O horror é nada. Sangue, tripas, carnificina

Tudo material de oficina de ourivesaria, e da mais fina.

Qual o rubi capaz de brilhar com mais glamour

que o sangue encastoado em baionetas, navalhas

e seringas infetadas?

O horror é a festa de toda a inocência de um livro da Condessa de Ségur.

Vem a cheia, o tornado, o pobre esfaimado, tudo vibrante de violência,

dar cor ao desespero. Nada mais belo que o ódio a cintilar, refletido

nas lágrimas de um choro sentido, da vítima a fraquejar até à morte.

Como são lindos os farrapos góticos da terra revolvida dos cemitérios,

as colagens surrealistas dos detritos dos hospitais,

o choro que precede o suicídio. Como é belo...

Como seduz o povo em via sacra, arrastando-se sobre as arestas

das escadarias

dos santuários

imprimindo, em cada alma lavada na dor, o sangue seco dos sudários.

Como é belo o horror, de porte atlético, esquelético,

dependurado na cruz do seu santo e justificado estertor. Como é suave a carícia dos espinhos

dos cilícios

dos suplícios.

Incontáveis os benefícios de em tais malefícios, sorridente, me albergar.

Que felicidade.

Artigos da mesma série:
publicado por Manuel Anastácio às 23:35
link do post | Dizer de sua justiça | Adicionar aos favoritos
1 comentário:
De glaucia lemos a 25 de Março de 2013 às 00:21
Só encontro uma palavra: Impressionante.

Dizer de sua justiça

.pesquisar