Domingo, 27 de Maio de 2012
Melancolia

Melancolia, de Albrecht Dürer


A melancolia não é um estado depressivo. Pode ser ou não. Não é isso que a define. A melancolia é o estado de alma que nos aproxima do peso e do número das coisas. É o estado necessário para a compreensão íntima da música. Uma pessoa que afaste a melancolia nunca será - notam a aliteração? - um melómano, porque não apreende intuitivamente os números e as grandezas - e a música não é mais que grandezas puras em diálogo, onde apenas o timbre se insinua como elemento concreto a contaminar de realidade material um objeto feito de vibrações e de tempo. Enquanto que os estados despreocupados e luminosos nos conduzem à unidade do real, a melancolia conduz à multiplicidade definida de cada instante, como acontecerá a um cego que se orienta, no mundo, guiado pelas dimensões exatas e relações espaciais definidas e de preferência não alteráveis. O melancólico vê em cada acidente do real a excepção, sem desejar sistematizar o mundo em regras mais ou menos constantes e, por isso, evita a ação por lhe faltarem os instrumentos com que poderia redistribuir o real. Para o melancólico, o número é a quantidade contemplável mas alheia a qualquer manipulação ou operação.

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publicado por Manuel Anastácio às 10:59
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5 comentários:
De gláucia lemos a 27 de Maio de 2012 às 16:11
Um novo olhar sobre o fenómeno da melancolia. Um olhar racional sobre algo sempre enfocado sob a luz da emoção. Não é para ser lido apressadamente, em um blog, precisa de leitura lenta e reflectida . Muito interessante.
De Manuel Anastácio a 27 de Maio de 2012 às 18:54
Na verdade, não é umolhar novo, mas uma reflexão a partir da gravura de Durer... :)
De Gerana Damulakis a 30 de Maio de 2012 às 03:39
"A melancolia é o estado de alma que nos aproxima do peso e do número das coisas." Excelente colocação. Vou levar para o leitora que, atualmente, é um local onde guardo o que gosto. Posso?
De Manuel Anastácio a 30 de Maio de 2012 às 23:56
Gerana, ainda pergunta? Nem sabe como gosto de a ver por aqui de novo. Beijo melancólico. É como me sinto hoje.
De Gerana Damulakis a 31 de Maio de 2012 às 01:36
Já está lá. Que frase!
Beijão, sem melancolia (pelo menos no momento).

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