Terça-feira, 15 de Dezembro de 2009
Mote 2

 

 

Como necrópole, esta rua. Este muro.

Esta janela. Este crepúsculo.

Névoa, geada. Translúcidos recortes de renda e sombras sobre a cortina.

Sozinha, em horizontal  e funérea neblina,

Em casa débil e desprotegida, escondida,

Em leve mortalha nupcial, de musselina.

Duas casas para a frente, uma ao lado… três.

Ou o contrário. A tua vez.

Por desistência do adversário

Nada se mexe no jogo de xadrez.

Não se ergue o cavaleiro do cavalo derrubado.

O bispo é comandado pelo silêncio das torres sem ameias,

Alheias ao satânico e civil engano tumular. Insignificado.

À menina, a que os mortos devoram, através das teias,

Cada trémulo sinal de luz no seu olhar,

Vai morrendo o ar no peito,

Vendo, tremendo, o ar. Necrópole de granito.

Cidade de flores onde empalidece, aflito, o luar.

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publicado por Manuel Anastácio às 23:21
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5 comentários:
De Gerana a 16 de Dezembro de 2009 às 00:32
Nem tenho muito o que dizer agora porque, vc sabe, a primeira emoção me toma muito. Este é de chorar.
De Gerana a 17 de Dezembro de 2009 às 01:48
"Cada trêmulo sinal de luz no seu olhar,

Vai morrendo o ar no peito,"

Isto é simplesmente perfeito!

De Manuel Anastácio a 17 de Dezembro de 2009 às 22:13
Gerana: obrigado. Perfeito, não é. Mas a sua bondade é, com certeza. Abraço
De Gerana a 17 de Dezembro de 2009 às 23:41
Qual bondade, qual nada! Uma das poucas coisas que sei é reconhecer quando um conjunto de palavras dá em verdadeira e pura poesia.
De Maria Helena a 18 de Dezembro de 2009 às 20:15
Diz um provérbio chinês que quem não sobe às montanhas, não vislumbra planícies.
Há esperas que justificam o tempo, explicam a suave beleza de um luar aflito com a palidez das noites.
Amigos e flores têm em comum o uso: quando a flor morre, a cor deixa de existir.

Dizer de sua justiça

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