The Dark Night of the Soul, de Loreena McKennitt, segundo sugestão da Canduxa, autora do nome mais poético que já vi para um blogue.
Numa noite escura
Em ânsias, de amores, inflamada,
Ó ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Estando já a minha casa sossegada.
Às escuras, mas segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Ó ditosa ventura!
Às escuras e velada,
Estando já a minha casa sossegada.
Na noite ditosa
em que em segredo, ninguém me via,
Nem eu via outra coisa
Sem outra luz ou outro guia
Senão aquela em que meu coração ardia.
Esta me guiava
Mais clara, a luz, que ao meio dia,
Até onde me esperava
Quem eu bem me conhecia,
Em parte onde ninguém aparecia.
Ó noite que me guiaste!
Ó noite mais amável que a alvorada!
Ó noite que juntaste
O amado à sua amada,
Sendo a amada em amado transformada!
No meu peito florido
Que inteiro para ele se guardava
Ali caiu adormecido
E ali o embalava
Com a brisa que os cedros levantava.
O vento das ameias,
Enquanto os cabelos lhe esparzia,
Com a sua mão serena
Contra meu colo me feria
E todos meus sentidos suspendia.
Desfaleci, abandonei-me
Com o rosto reclinado sobre o Amado,
Tudo acabou e deixei-me,
Negando-me a qualquer cuidado,
Entre as brancas açucenas olvidado.
(versão de Manuel Anastácio)
Nota: a minha versão não é, provavelmente, muito fiel ao original, até porque mantive algumas eventuais falhas de tradução porque, ainda assim, as considero mais próximas do sentimento expresso pelo autor, tendo em conta a tensão entre as palavras e o indizível. Há, aliás, um verso que, provavelmente mal traduzido, e de má construção frásica, é aquele que prefiro. É como um poema de amor adolescente - ora, não há poemas mais mal escritos que os lindos poemas de amor dos adolescentes. E não há noite mais escura que a adolescência - nem mesmo a senectude.