Foi o leão em caçada
C’ o lobo e outros que tal,
Sujeitos à sua alçada.
A raposa e o chacal
Detiveram na empresa
Comprometimento igual.
Procurando com destreza,
Um veado encontraram
Que logo se tornou presa.
Comprazidos, argumentaram
Como o iriam cindir,
Mas pouco mais conversaram
Ao ouvirem proferir
Estas ordens do leão:
“Há que em quatro dividir
a carcaça em rectidão.”
Fizeram-no de bom grado,
Procedendo à divisão
Depois do bicho esfolado.
O leão que tudo vira,
Tudo deu por aprovado.
Autoridade transpira
Enquanto se pronuncia:
“O quarto que aqui se estira,
Convém-me por regalia,
Que sou rei dos animais.
O segundo, todavia…
Também me cabe, ademais,
P’la responsabilidade
Do poder dos tribunais.
O terceiro, na verdade,
Tendo em conta o meu trabalho
Meu é, sem perplexidade.
O quarto quarto não falho
Nestas minhas pretensões:
Transformarei num frangalho
Quem ignorar as razões
- que me isento de ditar –
Que unem as quatro porções
Em meu exclusivo jantar.”
Baixando o focinho ao chão,
Sem queixas apresentar,
Permitiram ao leão
Consolar o apetite.
A zorra sem pretensão
De esperar outro convite
Sai dali envergonhada
E entre dentes se permite
À sentença confirmada:
“Hão-de os grandes te pedir
Os esforços da caçada,
Que nunca irão dividir,
Em equidade e justiça,
O despojo que acudir
Frente à sua vil cobiça.”
(versão de Manuel Anastácio)