Quinta-feira, 24 de Agosto de 2006
Buscas pedidas - "Ribeira da Brunheta IV"


Chego finalmente ao velho casario da Ribeira da Brunheta. A aldeia viva, em si, não é aqui, mas, para mim, não existe outra. Sinto-me um pouco incomodado em verificar que este passeio veio apenas tornar em mim ainda mais pungente o nefasto sentimento do saudosismo. Mas, por outro lado, há que olhar para estas ruínas, para estas estruturas de adobe e vigas de madeira derruídas como um testemunho necessário para o futuro. A máxima cristã da necessidade da morte para que se viva - o mito da fénix renascida - pode ainda dar frutos neste chão queimado. É preciso não pararmos no romantismo das ruínas nem na nostalgia anémica das recordações. Mas, infelizmente, ainda resta por aqui a noção de que arrasar para construir (sem qualquer pretensão de reconstruir) é mais barato. Uns barracões de chapa de zinco, mais acima, devorados pelas chamas, fazem-me pensar no que será melhor: o completo abandono das terras ou a sua desfiguração completa. É que, apesar de pouco restar, a face viva do passado ainda é reconhecível. E seria uma pena que sobre ela apenas recaísse a erosão do labor inconsciente de quem não dá valor às pequenas coisas.



Por quanto tempo ficará aqui esta oliveira sobranceira ao jardim abandonado? Não será substituída por uma geneticamente formatada pelos padrões míopes da economia agrícola europeia? Por quanto tempo deixarão estas adelfas crescerem sem peias à sua sombra? Estas adelfas que, provavelmente, são irmãs das que cresciam em volta da Capela da Senhora do Tojo, no alto desta aldeia - e onde o meu passeio não se chegou a prolongar. As adelfas da Senhora do Tojo, local de uma aparição caseira, já não existem. Um incêndio reduziu-as a cinzas.



Deixo-me, então, encantar pelos recantos poéticos do que resta, esperando que outra poesia venha a substituir o encanto da degradação. Que estas mesmas escadas sejam pisadas por pés conscientes e com vontade de substituir os fetos e as silvas pelo fruto do trabalho responsável.



Mas que permaneçam estas pedras em consola...



... quando estas voltarem a ser consoladas por uma mão humana...


... que saiba respeitar o Paraíso. Ou reconhecê-lo em sonhos, pelo menos.
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publicado por Manuel Anastácio às 16:17
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4 comentários:
De Jacinto santos a 8 de Junho de 2018 às 21:25
Também sou neto do Alvaro do moleiro e a história de nadar e apanhar peixes no rio e uma grande besteirada e quanto às azenhas infelizmente sou eu que pago o IMI ass. Jacinto santos
De Manuel Anastácio a 9 de Junho de 2018 às 03:05
Não falo de Azenhas nem de rios neste texto. Não compreendo o seu seu comentário. Mas gostaria de compreender, se me der o benefício da sua paciência.

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