Estação de caminhos de ferro de Vilar Formoso. Painel de azulejos: Ponte da Canharda, Linha da Beira Alta
Carlos Nepomuceno, professor e pesquisador no Instituto de Inteligência Coletiva (Brasil), co-autor do livro "Conhecimento em Rede" responde, neste artigo, a uma provocação de Henrique Antoun, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro: "o usuário que colabora [em sites colectivos, como a Wikipédia] é colaborador ou apenas um otário?". Segundo Nepomuceno, desenham-se duas teorias: a hipótese do elevador, em que, perante um problema que urge solucionar, todos falam. Num elevador é normal ficarem as pessoas com o olhar vidrado, incapazes de olhar nos olhos os companheiros que compartilham o espaço, ameaçados que se sentem pela proximidade violadora do seu espaço de respiração pessoal. Contudo, quando o elevador pára, subitamente, encravado em terra de ninguém, todos falam. Todos dão a sua opinião. Todos raciocinam colectivamente mesmo que da conversa nada saia de efectivamente praticável. Assim nasceram os fóruns da Internet. Incapazes de resolver um problema, as pessoas viram-se para Santo Google. Quando Santo Google não ajuda, vai-se a um fórum. Deixa-se a questão. E, com sorte, entre opiniões mal informadas, encontramos a saída que procuramos. A gratidão que nasce do alívio de encontrarmos uma resposta predispõe-nos, depois, a também ajudar outros que venham à procura de ajuda. Lemos as suas perguntas. Por vezes, fazemos a simples pesquisa que o pobre em dúvida não conseguiu, por inépcia, fazer. Ajudamos os outros mesmo que nada ganhemos em troca. Mas esta teoria parte sempre da possibilidade de nos virem, alguma vez, também a socorrer. O altruísmo (ou a qualidade de ser otário, segundo Antoun) não é completo.
Resta a teoria de que participa na rede quem procura amor na suas várias formas. Como quem frequenta discotecas, pubs e bares, à procura de alguém a quem se possa mostrar. Alguém que olhe para nós e diga: ah, tu existes. Não tenho a menor das dúvidas de que esta teoria, incorporando a primeira hipótese do elevador, é mais abrangente, explica mais casos. É a mais adequada. Mas não explica tudo.
Não explica o facto de o contribuinte da Wikipédia ser, geralmente, anónimo...
Painel de azulejos na Estação de Caminhos de Ferro de Vilar Formoso: "Castelo de Guimarães"
Para alguns de Braga, Guimarães é Espanha. Para o resto da Nação, Guimarães é o Berço da Nação. E não vou agora contribuir para tal discussão.
Para mim, Guimarães é a Natureza lentamente torcida pelo peso do granito. É o que penso quando olho para o chão que piso (ainda há dias levei um raspanete de uma colega que me mandou olhar cima, levantar o queixo, como se olhar para o chão fosse um sinal de desalento, quando não é). Olho muito para o chão enquanto ando. Gosto de caminhos. Gosto de sentir o chão (para desespero da Carla que detesta ouvir-me a raspar o chão com as solas dos sapatos enquanto ando).
Gosto de caminhos. Há uma versão, pouco aceite, aliás, e sem grande fundamento documental, que faz derivar o nome de Guimarães de uma suposta inscrição na porta de entrada da torre de menagem do Castelo, ou mesmo numa pedra do frontispício da já derrubada Capela de S. Tiago na Praça do mesmo nome. Capela essa, agora marcada em planta no pavimento granítico desta praça, comunicante com a da Oliveira. Diria a inscrição "Via Maris". Caminho do Mar. Gosto da hipótese. Gosto destes caminhos etimológico-toponímicos alternativos.
Painel de azulejos na Estação de Caminhos de Ferro de Vilar Formoso: Almeida: antigo quartel general, depois cadeia e, hoje, Câmara Municipal (creio eu).
Painel de Azulejos na Estação de Caminhos de Ferro de Vilar Formoso: Mosteiro da Batalha. Clicar para ver em pormenor (voltar a clicar na página que abrir).
... mesmo na versão postal.
Capitel do portal da Catedral de Autun (1130 - 1140). Desenho de Eugène Viollet-le-Duc, em
Dictionnaire raisonné de l’architecture française du XIe au XVIe siècle.
Depois de ver morta a presa,
O lobo deitou-lhe o dente.
Mas calhou-lhe na empresa
Que um ossinho impertinente
Se viesse a alojar
No pescoço imprevidente.
Estando assim a agonizar,
Incapaz de engolir,
Incapaz de vomitar,
Tanto se pôs a ganir
À procura de conforto
Que, sem ninguém oprimir,
Para chegar a bom porto,
Desfez-se em suaves juras,
Por não poder falar torto
Às mesquinhas criaturas
De quem estava dependente.
"É com palavras seguras,
Que eu, agora penitente,
Prometo mundos e fundos
A quem se mostrar valente,
E nos estreitos profundos
Do meu nobre gorgomilo,
Onde os ais são oriundos,
Consiga tirar aquilo
Que agora me tira o sono
E não me deixa tranquilo."
Não deixado ao abandono,
Veio o grou em valimento
Pelo prometido abono.
Directo ao encravamento,
Fez perfeita a cirurgia
E apagou o sofrimento
Ao lobo que assaz gania.
"Abri, senhor, a goela
Até ver a luz do dia,
P'ra que dê uma olhadela,
E, com o bico, consiga
Remediar a mazela."
Antes que o grou se desdiga,
Fica o lobo escancarado
E o grou pronto investiga
Com o pescoço enfiado
Da boca até à barriga
Do predador melindrado
Até ter visto extraído
O ossinho aziago.
"O que me foi prometido
Espero qu' ora seja pago",
Disse o grou, persuadido
De não vir dali estrago.
Ao que o lobo respondeu
Mostrando os feros caninos
E assim agradeceu:
"Que desejos peregrinos
É que, tola, concebeu
A tua mente? Cretinos
São os que suspiram
E anseiam favor régio
E nem sequer se admiram
Nem do benefício egrégio
A que mui poucos aspiram
Nem do grande privilégio
Que é na minha boca entrar
E de lá sair inteiro."
Assim faz quem governar,
Que quem se vê em Primeiro
Bem se pode endividar,
Que o calote voa ligeiro.