Segunda-feira, 26 de Março de 2007
Novíssimo Manual de Conduta do Seguidor de Jesus

Restauro do Jesus Crucificado no Convento de Nossa Senhora da Caridade1, Sardoal. Fotografia minha, em Creative Commons.


Jesus Cristo foi, sem dúvida, a mais importante personagem da História da Humanidade. Que me perdoem as outras religiões (incluindo as não religiosas), mas ninguém pode, sequer, aproximar-se um pouco que seja da resplandescente Glória de um Homem que se não foi Deus, foi aquele que mais próximo disso esteve. É a minha opinião.

Outra coisa, bem diferente, é vermos Jesus através das lentes deformadas dos teólogos e Doutores da Igreja que tanto se preocuparam com a sua Natureza e se esqueceram das suas palavras. Ainda hoje alguém me escrevia numa caixa de comentários "não me conhece de lado algum". De facto, não conheço Jesus de lado algum, tal como não conheço o Luís Bonifácio de lado algum. Mas conheço as palavras que deles me chegaram. No primeiro caso, de forma indirecta e, talvez, obscurecida pelos narradores que, tal como os de hoje, terão dado volta ao texto para, mesmo quando escrevessem verdades, nos conduzirem à mentira ou ao equívoco controlado. No segundo caso, de forma directa. As palavras de Luís Bonifácio são dele, escritas pelo seu próprio punho, concebidas na sua mente. Mas dão azo a incompreensão de parte a parte. Eu, provavelmente, não entenderei totalmente o que o Luís quer dizer - parto de princípios e de uma filosofia de vida diferente, tive experiências diferentes, a verdade apresenta-se-me de forma diferente. Logo, se é tão difícil compreender alguém que nos dá as suas palavras com a força da sua presença, como será possível compreendermos as palavras de alguém que nos chega da boca de outros? A realidade é que não é possível. O pensamento de Jesus esbateu-se irremediavelmente para os outros a partir do momento em que o tentou transmitir. O mesmo acontece connosco. Escrevemos - e julgamos que dizemos mais e melhor do que julgávamos ser capazes ou, o que é mais frequente, desesperamos pelo facto de as palavras erguerem-se como muros de silêncio. E, por isso, escrevemos poesia, que não é mais que, através das palavras, dizer o que as palavras não dizem nem nunca conseguirão dizer.

Quem ouviu Jesus, provavelmente, não sabia que estava a fazer História. Não sabia que estava perante a mais forte impressão de luz que a nossa curta eternidade permitiria aguentar.

Hoje sabemos. Dizem-nos, desde crianças, que Jesus é Bom. Logo, predispomo-nos para encontrar bondade nas suas palavras. Mas há mais que bondade. Há denúncia, há raiva, há orgulho, há dor, mas tudo revestido de uma tal luminosidade que só nos fica impressa a ideia de perfeição. Não sei se Jesus teria sido um bom escritor ou um bom filósofo. Foi, com certeza, um modelo de Humanidade.

E tudo isto para saudar aquele que, para mim, é um dos mais claros textos sobre as palavras de Jesus como deveriam, provavelmente ser lidas e ouvidas nos nossos dias. O Paulo Brabo, o autor, não é padre nem professor. Tanto quanto sei, não é Santo nem faz tenção disso. Mas tenho a certeza que Santo Agostinho teria gostado de trocar alguns argumentos com este Paulo que, de semelhança com o de Tarso, tem o dom de transformar as palavras que nos ficaram daquele que viveu por nós num monumento, talvez independente mas, ainda assim, de uma eterna humanidade. E sinto-me honrado por, em estranhas andanças na Internet, ter sido conduzido até àquela Bacia das Almas, quando procurava, literalmente, as Índias Ocidentais, onde o Paulo me recebeu de braços abertos, chamando-me de "Venturoso".

São 29 páginas de um sorriso aberto, de um toque de inteligência, humor e pura felicidade de existir. Bem gostaria que todos aqueles que aguentaram todo este meu texto enfadonho fizessem o download desta pequena Grande Obra, de seu nome "Em Seis Passos, que Faria Jesus: Novíssimo Manual de Conduta do Seguidor de Jesus", a imprimissem, a fotocopiassem e a oferecessem. Não estarão a violar direitos de autor porque o Paulo a colocou em Creative Commons. Só não a podem vender.

Para baixar/ler esta obra em formato PDF clique aqui ou aqui ou aqui. Para ler o livro na própria "Bacia", pode folhear o arquivo virtualmente numa janela maior.

1A ver ao vivo nas festas da Semana Santa no Sardoal. Lembro-me da primeira vez que vi este crucifixo, no final de uma procissão dos fogaréus, num fim de dia ventoso e húmido, já então em muito mau estado de conservação. As portinholas do nicho batiam com a fúria própria de um filme de horror, enquanto os fogaréus iluminavam os rostos nublados numa piedade felliniana. Terá sido, com certeza, uma das mais fortes imagens que deixarei gravada na escuridão do eterno silêncio.
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publicado por Manuel Anastácio às 18:49
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Sábado, 24 de Março de 2007
Curta 31
1. Orlando Braga faz mais um dos seus posts em que copia um excerto de um espantoso libelo homofóbico, por acaso, de leitura imprescindível. Nem só de boas leituras se forma o carácter. Temos também de ler, de vez em quando, panfletos declarados.

2. O Luís Bonifácio, na mesma onda, escreve no comentário:
"Substitui o artigo sobre a Heterossexualidade com uma tradução parcial do artigo da Wikipedia Inglesa.
A ver a guerra que o Lobby gay vai fazer!"

3. Eu respondo:
“Substitui o artigo sobre a Heterossexualidade com uma tradução parcial do artigo da Wikipedia Inglesa.” - ou seja: faz um vandalismo, contra as regras instituídas no projecto, para os podermos atacar por outra razão que não aquela que provocará reação (o pessoal revolta-se contra a “substituição do texto” por uma tradução parcial - em vez de desenvolvimento do texto; e nós aproveitamos para dizer que é o Lobby Gay… 1+1=5!)… Lindo, Bravo, meus caros: ao menos, vemos claramente como funcionam.

O pior é que não têm vergonha na cara, mas orgulho da sua falta de seriedade...
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publicado por Manuel Anastácio às 14:20
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Enciclopédia íntima: Lentidão

"Liturgia de cristal", "Quarteto para o Fim do Tempo", Olivier Messiaen

A Lentidão não é sinónima nem parente da preguiça. Não é um vício, mas uma virtude. Quando dividimos o mundo em Luz e Escuridão, entre Bem e Mal, estamos, em grande parte, a distinguir entre as experiências que nos são oferecidas em turbação, em ruído e na instabilidade da angústia e as experiências que nos aparecem definidas, claras, equilibradas – e, eventualmente, instáveis e até mesmo angustiantes mas onde se conseguem definir pontos de fuga. O Inferno tem-nos sido recalcado como um reino de partículas em choque onde as almas assumem esse papel atómico – os seus elementos são indivisíveis, mas o meio é feito de constante permuta. O indivíduo está encerrado na sua dor, percorrendo as angústias num constante movimento de vórtice. Os buracos negros vieram dar luz, fornecendo-nos um modelo com aparência de realidade, a este eterno sofrimento. Dante, ao inscrever na porta do Inferno o aviso “Lasciate ogne speranza, voi ch’intrate” sabia bem que iria descrever o reino das almas que não mudam, daquelas que se apegam orgulhosamente – por vezes, até com dignidade e compaixão – à dor de terem vindo nascer a um mundo que não pediram, perante uma Salvação que não desejam nem poderiam desejar, ciosos da sua Identidade. 

O mundo actual é geralmente associado à rapidez e à mudança. Temos, até, a tentação de confundir rapidez com mudança. Mas é um logro. Este mundo é, de facto, rápido, e basta passarmos levemente os olhos sobre o panorama da história da humanidade para compreendermos a cegueira dos criacionistas que julgam que o ser humano nasceu há coisa de 6 000 anos. Esta aceleração das permutas entre átomos humanos, ciosos da sua Identidade, repito, é aquilo a que designamos de Inferno na Terra. Chocamos com os outros. Temos medo dos outros. Porque há rapidez nos gestos, nos encontros, nas trocas, nos olhares, nas decisões. O tempo, tornando-se cada vez mais uma coisa real, existe cada vez menos, porque se o meio nos oferece mudança e rapidez, o nosso núcleo encerra-se no medo, na insegurança e na angústia perante a destruição eminente. O conservadorismo atávico agudiza as suas lanças repulsivas perante o Outro, o Estrangeiro, porque esse outro vem de uma atmosfera de perturbação, vem a voar na nossa direcção no meio de outros Estrangeiros que nos tapam a vista e nos assombram o horizonte. Acirramos a nossa Identidade, mumificamo-nos, porque o mundo está a ser remexido por varas que nos põem a todos em suspensão. Vivemos numa realidade coloidal, em movimento, mas em que cada partícula se recusa a acrescentar o que quer que seja ao seu núcleo. Há rapidez e movimento, mas não há mudança. Falo da mudança  essencial: da mudança a nível espiritual – a nível humano. Somos, pelo contrário, incentivados a  “sermos nós próprios”, como dizem os papás das cobaias dos “Big Brothers” – votem no Zezé porque ele não está a fingir, não está a jogar, mas a ser ele próprio – ele é assim mesmo. Que logro, revestido de autenticidade!!...

Na verdade, só seremos nós mesmos, só seremos autênticos, quando nos quisermos identificar, não connosco, mas com o Ser. E esse Ser, procura-se. Também em nós mesmos, mas não só. Precisamos de nos virarmos para os outros, mas esperar que a atmosfera, turva, assente à nossa frente. Precisamos de lentidão. Porque é na lentidão que os núcleos atómicos da nossa Identidade se predispõem a mudar, ao aceitarem o papel de “germes de nucleação” que vão assimilando à sua superfície as partículas da aprendizagem. É na lentidão que se formam os flocos de neve (não necessariamente uma lentidão cronológica). Tudo começa com uma partícula de pó que aceita agregar a si, por precipitação, as partículas que enxameiam o ar. Tudo começa por aceitarmos agregar à nossa superfície a complexidade fractal do cristal que se expande. Só assim poderá o grão de poeira revestir-se da Glória da complexidade perfeita da regularidade, do Bem, da Felicidade – da Beleza.

Jesus Cristo disse-nos isso claramente ao dizer que precisávamos de morrer para nos salvarmos da Morte. A semente só vive quando aceita morrer. Quando nega a sua Identidade de semente e decide criar raízes e abrir-se ao mundo, à Terra, ao Ar, à Luz. Só somos quando aceitamos não ser. Essa é a única autenticidade possível. Não digo, contudo, que a memória se deva perder nesse processo. E para isso, é necessária a lentidão. Para isso, é preciso saber o que é escrever um texto como fazia Flaubert, escolhendo cada palavra – o “mot juste”.É preciso compreender os planos mais lentos de Manoel de Oliveira. É preciso saber ouvir a música que só com atenção se sedimenta no nosso gesto de ouvir. Mas isso são experiências estéticas. É preciso, em primeiro lugar, aprender a ouvir e a amar os Outros. Essa é uma experiência Ética que também precisa de lentidão. Um plano lento, uma página difícil, um grupo sonoro atonal são perfeitos exercícios de humanidade. Nem sempre – ou raramente – são divertidos, mas imprimem-nos um largo sorriso íntimo, ao sentirmos que nos cobrimos com os cintilantes raios de um cristal que ainda está no seu início. E nós ao centro, diferentes de nós mesmos.

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publicado por Manuel Anastácio às 13:07
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Sexta-feira, 23 de Março de 2007
Curta 30


Enquanto os meus alunos se divertiam à sombra destas árvores, no parque do Lar de Santa Estefânia, diverti-me a tentar focar os estames pendentes destas flores sem pétalas. Não sei que árvore é. Alguém me ajuda?

Há folhas de nespereira (designada por muitos vimaranenses como magnoreiro) por aqui misturadas. As folhas palminérveas desta árvore que não consigo identificar, estão ainda em fase juvenil.
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publicado por Manuel Anastácio às 23:08
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Quinta-feira, 22 de Março de 2007
Curta 29
Excelente, este texto sobre a ressuscitada (à conta não sei de que santo) luta entre criacionistas e evolucionistas. A ler com calma e ponderação.
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publicado por Manuel Anastácio às 22:03
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