Terça-feira, 27 de Junho de 2006
Herbário I Brassica oleracea
Flores de couve; foto por Manuel AnastácioSei que o primeiro homem couve
Não se incomodava
Nada, em passear na brisa
Sem enxotar as lagartas,
Verdes e aveludadas,
Que lhe subiam aos ombros,
Por glaucas calçadas,
Segregando-lhe o pecado
Do fruto negado
Que há em desfolhar-se.
Foi por isso que floriu.
E perdeu a inocência,
A verde inocência,
Sem abdicar da esperança
De ainda assim, renascer,
Em cada semente negra.
Na mortal inflorescência,
Festejou então
A singela e branca dor
De se ser sempre o primeiro.
Manuel Anastácio
Sábado, 24 de Junho de 2006
Ono no Komachi - Recusa
“Diana e Acteão”, gravura de Carlo Maratti (1625 – 1713) Tudo o que me ofereceste
Se tornou meu inimigo.
Não tivesse tais presentes
E, por um momento,
Talvez merecesse
Paz, esquecimento.
(Versão de Manuel Anastácio de um poema de Ono no
Komachi a partir de uma tradução de Hirshfield & Aratani).
Submeter-me a ti?
Poderá ser isso
O que estás a sugerir?
Queres que faça caminho
Sobre água que ondula?
Queres que obedeça
Ao vento ocioso?
(Versão de Manuel Anastácio de um poema de Ono no
Komachi a partir de uma tradução de Burton Watson)
Terça-feira, 20 de Junho de 2006
Ono no Komachi - Insídia
Gravura:Placa 62 da Kunstformen der Natur (1904),
de Ernst Haeckel, com espécies da família das Nepenthaceae.
Pensei em colher
A flor do olvido
Para uso próprio.
Mas fui encontrá-la
Já a germinar
No coração de quem amo.
(Versão de Manuel Anastácio de um poema de Ono no
Komachi, a partir de uma tradução de. Hirshfield & Aratani)
Sábado, 17 de Junho de 2006
Khayyam I
Ergue-te, não durmas mais
Porque o efémero onde segues
Desemboca na Eternidade
De um doce sono.
Ergue-te,
Não chores se não és dono do jogo,
mas o Céu.
Ergue-te e ignora
Os lances celestiais que te deslocam.
Ignora o destino e ergue-te.
Não durmas mais.
O saco vazio do nada
Espera as peças dispensáveis
Ao recreio do Céu.
Ergue-te.
Ignora.
Não chores.
Enquanto escrevia este poema, inspirado em Khayyam, poeta persa (iraniano), decorria o jogo Portugal/Irão, no Mundial. Coincidência apenas. Ou talvez não.
Quinta-feira, 15 de Junho de 2006
Ono no Komachi - Amor
"L'Amour Blessé" por Dorothy Tennant (1895)
Os homens chamam de Amor
A uma simples corrente
Que impossibilita a fuga
Deste mundo de cuidados.
(Versão de Manuel Anastácio de um poema de Ono no Komachi,
a partir de uma tradução de Helen Craig McCullough)