Segunda-feira, 5 de Outubro de 2009
Naquela aldeia, uma árvore, e debaixo dela, homens

Hoje, vi um homem a chorar por causa de um carvalho que está a morrer. Basta-me isso para acreditar. No quê? Será preciso dizer?

 

Não levei máquina fotográfica e não pude registar nem as lágrimas nem os ramos secos da árvore.

 

Hoje estava para falar de Daniel Barenboim e das suas palavras sobre a música e sobre o Todo, que me foram oferecidas em presente pela Maria Helena. Tive, contudo, que percorrer os campos de Serzedelo e de Guardizela em campanha eleitoral. Terminei o dia num jantar da lista do Bloco de Esquerda em Serzedelo, numa sala apertada do grupo desportivo local. Foi aí que vi gente que apenas quer "fazer o bem". Não querem impor a ditadura do proletariado nem fazer uma revolução cultural maoísta. Querem apenas que as telhas, postas sobre a Igreja de Santa Cristina, pela proverbial incompetência do IGESPAR não deixem a água escorrer para cima do padre e das crianças que aí têm a doutrina nem firam a cabeça de quem esteja debaixo do beiral. Querem que uma ponte românica não seja devorada pela indiferença. Querem que os antigos marcos administrativos do Concelho de Barcelos (conta a História) não sejam roubados para enfeitar jardins privados.

 

Hoje, vi um homem a chorar por causa de um carvalho que está a morrer. Basta-me isso para acreditar. No quê? Será preciso dizer? O silêncio não será suficientemente eloquente? Hoje estava para falar do silêncio como matéria e força gravítica da música e da poesia, de acordo com as palavras de Barenboim. Um justo, como me dizia em carta a Maria Helena. Um justo. Hoje, estive com homens e mulheres que são justos. Que sabem que a gamela do poder não está aberta para a sua boca. Nem é preciso. Os justos não têm a boca cheia de fome. Têm a boca como a das aves, que regurgitam vida para outras bocas, mesmo quando o corpo começa a render-se à inanidade. Não andámos à caça de votos. Andámos à pesca de homens justos, como São Pedro, que nos brindou com um fim de dia chuvoso. À pesca de vontades, de justiça e de bondade. Foi um bom dia.

 

Hoje vi o Josias, cabeça de lista por Serzedelo emocionado por causa de árvores, de fontes, de pedras lavradas... E as pessoas? O Josias não se preocupa com as pessoas, dirão alguns que me vierem a ler? E eu respondo com o silêncio claro das manhãs que cantam. Não há discursos nem doutrinas políticas que façam sombra a quem ama a vida sem enganos.

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publicado por Manuel Anastácio às 22:13
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De Maria Helena a 8 de Outubro de 2009 às 13:17
Ser justo no AT nada tem a ver com ser honrado ou cumpridor da Lei.
No AT ser justo significa ser seguidor e fiel (essencialmente fiel) à bondade e ao amor de Deus.
Todos sabemos que é bem mais fácil ser honrado que ser bondoso.
E também sabemos que muitos que pregam Deus apenas apregoam a Lei esquecendo-se da Boa Nova.
Josias, que chora a morte de um amigo que transporta, desde as raízes às folhas sussurrantes de sopros de vida, o património de muitos afectos é um homem bom, de certeza.
Justo, portanto.
De Manuel Anastácio a 8 de Outubro de 2009 às 19:29
É, com certeza. NO sentido do AT e do NT, também...
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