Casablanca, de Michael Curtiz: o Inferno e o Hoje de mãos dadas (se não der para ver, ir aqui).
Depois de ter apresentado as minhas intenções de subverter o texto bíblico segundo as minhas palavras, a Maria Helena deixou-me um belo comentário a respeito das inquietações teológicas que me assaltavam quanto às palavras de Cristo ao chamado vulgarmente "Bom Ladrão", que eu quis chamar de "malfeitor arrependido", e que me fez passar um vergonha no 5.º ano quando eu me referi a ele, numa aula de Religião e Moral, como o Ladrão Bom. Enfim. Cheguei à conclusão que... não cheguei à conclusão, de facto: retornei à minha própria conclusão, que já direi qual é.
Conhecem aquelas senhoras que dizem que na outra vida foram, invariavelmente, a Cleópatra? Os homens costumam preferir Napoleão - não sei por que razão... Interessante que ninguém se aventura a ter sido Casanova... Pois, eu, fui, de certeza absoluta, Santo Agostinho. Quando li as "Confissões" confesso que tive vontade de ouvir alguma voz divina a dizer para ler as instruções a seguir num livro aberto ao acaso. Mas os milagres estão pela hora da morte, mesmo quando se trata de uma corriqueira revelação pessoal e íntima. Num mundo tecnologicamente1 avançado como o nosso, onde o virtual supera em riqueza de emoções orgânicas o mundo real, as revelações divinas são um simples charro sem grandes consequências. Pois, se tive alguma revelação com Santo Agostinho, que li lentamente, entre as terras do Alandroal, Carvalhal e Praia da Conceição (alguns grãos de areia rica em iodo o poderão confirmar entre as páginas do livro que tenho em casa), foi a revelação de alguém tão fraco como eu, tão pouco santo como eu, que, ainda assim, tinha a auto-estima (autoestima?) tão elevada que se deu ao trabalho de confessar em escrito aquilo que o vento poderia soprar ao aspirante (de aspirar, como um buraco negro) ouvido de Deus, e sem retorno. Se tive alguma revelação pessoal com Santo Agostinho, foi a revelação de que, santos e não santos, todos somos iguais. Apenas alguns se apaixonam pela ideia de um Certo Deus (e chama-se a isso Graça Divina), enquanto outros permanecem orgulhosamente apartados da alegria da luz, como certas personagens da Divina Comédia de Dante - no capítulo onde aparece o Saladino, procurem se estiverem interessados, que eu não me lembro, não me apetece ir Google, e ainda tenho 24 testes para corrigir hoje.
Diz a Maria Helena:
"Quanto ao tempo, para Deus não existirá, como também mostra a frase..."
Deus está fora do tempo, de facto, como se verá (na minha perspectiva) na minha subversão do Génesis.
"O perdão de Deus e entrada no Paraíso é dádiva e não conquista (...)"
Graça divina. Confesso que não gosto muito desta ideia. Parece-me contradizer aquela que refere, a dado momento, a do livre arbítrio...
"(...) é conversão de coração no reconhecimento do sofrimentos dos inocentes, é a capacidade para esquecer o sofrimento pessoal e tentar confortar o que está ao lado a sofrer e que todos, sem excepção,e por muito que nos custe engolir na nossa pequenez do coração, têm com a mesmíssima intensidade e verdade, a redenção."
Isto já me toca mais. Para mim reduz-se tudo a uma palavra: ser Bom. Por acaso, ou nem por isso, fugi à palavra Bom na minha versão do primeiro capítulo do Génesis.
"(...) O lugar no banquete celestial está reservado a muitos para quem olhamos com desconfiança porque Deus é que nos sonda o coração e o conhece."
Agora, falaria das "Florzinhas de São Francisco" (outro santo que eu fui na outra vida)... mas não tenho tempo. Fica para a aposentadoria (é assim que se diz, Gerana?).
"Se Jesus foi directo ou não para o Paraíso, Manuel, confesso que não perco um segundo a tentar adivinhar. Já haveria Low Coast?! :-))))"
Hum... Acho que para o Paraíso não há aviões, só balsas daquelas que se faziam (ainda se fazem?) para sair de Cuba em direcção aos Estados Unidos...
Mas retomando: Hoje. Hoje é eternidade. Eternidade é Paraíso. A Eternidade opõe-se à Paixão. Agora citava Aristóteles, nas "Categorias" citadas por Santo Agostinho, a respeito da ideia de paixão, ou seja, sofrimento, não no sentido de dor, mas no sentido de ser submetido a uma acção, ou seja, no sentido de ser submetido ao tempo. Mas não tenho tempo de desenvolver a ideia... o tempo falta-me... faz-me lembrar aquele matemático que morreu num duelo... o Galois... e não tenho tempo!!!! E tudo para chegar à conclusão que:
O Paraíso está fora do Tempo. Por isso, qualquer momento, convertido ao Não-Tempo paradisíaco, é Hoje.
Resta-me acreditar que o Inferno, por oposição, é o Tempo. E sorrio. Nunca, nada, me pareceu mais claro que isto. Ainda bem que não tenho tempo para nada. Estava mais próximo do Paraíso do que pensava...
1. Já repararam que apenas um cn separa a tecnologia da teologia???