Sexta-feira, 16 de Janeiro de 2009
Ninfas

Cisnes brancos, foto de S Sepp em Creative Commons e GFDL.

 

Hoje (ontem, em relação à data de publicação deste artigo) a Wikipédia fez oito anos. O colega Eduardo Pinheiro foi à Antena 3 falar sobre aquele que, para mim, é o maior feito da Internet desde que se decidiram juntar computadores a uma escala global. É há de continuar a ser. Entretanto, penso em implementar projectos a nível da escola, para que possa, de novo, voltar a participar naquele projeto que tanto amo sem que tenha de roubar tempo às atividades de carácter pedagógico. O que é complicado. É que os computadores da escola são claramente insuficientes para fazer algo do género, e os computadores da e-escola continuam por aparecer para a grande maioria dos alunos (será que serão entregues na próxima legislatura?).

 

Hoje andei às voltas com a palavra "ninfa", no que diz respeito às metamorfoses dos insectos. Ensinei numa aula que é a fase intermédia entre a fase larvar e o inseto adulto. Depois, li algures: "o gafanhoto passa por metamorfose simples, passando apenas por uma fase larvar ou ninfa". E fiquei confuso. Teria, na próxima aula, de fazer errata das minhas afirmações. Não sou propriamente dos professores que nunca erram e raramente têm dúvidas. E há muitos destes últimos: não me refiro apenas a um certo professor de economia. E, ao contrário da maioria dos meus colegas, não tenho medo de responder "não sei" às perguntas que os alunos fazem (e são muitas), apelando à sua própria pesquisa. Contudo, não é assim. Julgo eu, agora. Ninfa é uma palavra utilizada indiscriminadamente, em português, tanto para definir a forma larvar já algo semelhante ao imago (insecto adulto) dos insetos hemimetabólicos, como a cigarra, como para se referir à fase inativa, intermédia entre larva e imago nos insetos holometabólicos. Como é hábito, a nomenclatura científica em português é confusa a esse respeito. A Wikipédia reflete essa confusão e o artigo Ninfa da Wikipédia em português ainda não esclarece a confusão. Mas há de esclarecer. Acredito que a Wikipédia serve como centro gerador de conteúdos científicos. Sei que os académicos portugueses fogem da Wikipédia-cruz-credo-canhoto-canhoto como o diabo supostamente foge da cruz, mas isso é apenas sinal do provincianismo da nossa elite cultural. Os conteúdos da Wikipédia estão sujeitos a muitos erros, mas ao abrir os portões à participação de todos, principalmente aos não especialistas, está-se a criar um ponto de referência que poderá congregar e descodificar a linguagem obscura que os académicos portugueses tanto gostam de cultivar, para mal do progresso da Ciência em território nacional. E grande parte dessa obscuridade advém de cada académico usar as palavras de forma rigorosa, admito-o, mas cujo rigor se limita ao campo lexical da sua panelinha que, provavelmente, difere de Universidade para Universidade. Um país tão pequeno com tamanho separatismo vocabular a nível das elites é coisa que espanta. A coisa piora, claro, quando passamos a englobar nestas diferenças académicas as versões brasileiras (que as outras lusófonas ainda não têm qualquer expressão). É por isso que é importante cutivar a Wikipédia em português: porque é o único recurso que temos para podermos vir a compreender tanta gíria obscurantista. A Ciência é só uma. A sua linguagem devia ser também, tendencialmente, una. A Wikipédia Lusófona é ainda apenas um reflexo fantasmático do que poderá vir a ser um dia. Mas está a dar frutos. Não nela própria, mas fora das suas fronteiras, entre outras fontes ditas mais confiáveis que começam a reagir criando e disponibilizando conteúdos que, não fosse a Wikipédia, se manteriam nos cofres dos senhores ciosos da sua egoísta sabedoria.

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publicado por Manuel Anastácio às 00:13
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De Gerana a 17 de Janeiro de 2009 às 02:31
Aqui a coisa do acordo está sendo levada muito a sério mesmo, tanto nas escolas, quanto nos jornais e revistas e livros. Mas eu já sei qual é a razão: o interesse do Brasil pela cadeira permantente na ONU e, para isto, a língua portuguesa terá que ser considerada ali. Você sabe que ela não é uma das línguas na ONU porque não há uma única maneira de escrever nos 8 países de língua portuguesa, daí o nosso imenso empenho para que isto aconteça logo.
PS: vc escreveu numa altura "insecto", depois "inseto" lá na postagem; pode verificar.
De Manuel Anastácio a 17 de Janeiro de 2009 às 10:43
Sim, de fa(c)to é assim...
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